O Desafio do Excesso na Publicidade
O período de fim de ano é reconhecido como um dos mais desafiadores e rentáveis para a publicidade, tanto no Brasil quanto globalmente. Com o Natal se aproximando, as marcas intensificam suas estratégias para atender à demanda do consumidor, que muitas vezes se vê impelido a consumir em função da carga emocional atrelada a essa época. Contudo, em 2025, o cenário se transforma com a combinação de novas tecnologias, a vastidão de dados disponíveis e a pressão por resultados, levando a criatividade a patamares extremos. O que deveria ser inspirador acabou se tornando um desafio, resultando em uma avalanche de campanhas que, ao invés de encantar, muitas vezes irritam os consumidores por causa do excesso de estímulos. Esse fenômeno dá origem ao que muitos chamam de “paradoxo da abundância”.
A crescente multiplicação de campanhas publicitárias expôs uma realidade preocupante: na corrida para atender as exigências de um público cada vez mais exigente, as marcas têm adotado uma abordagem que as leva a “atirar para todos os lados”. A presença em múltiplas mídias torna-se uma prioridade, e a ideia de estar em todos os lugares ao mesmo tempo prevalece. Esse comportamento resulta em comunicações que, ao serem repetitivas ou impostas, tendem a desgastar a paciência do público. As mensagens variam entre o previsível e o que pode ser considerado bizarro, o que acaba por gerar frustração e desinteresse.
A Fragmentação da Experiência do Consumidor
Além disso, a hipersegmentação baseada em dados, algo que se torna cada vez mais comum, especialmente em campanhas políticas, não garante a relevância esperada para produtos ou marcas. Na verdade, essa estratégia pode gerar experiências fragmentadas e sem significado. O que deveria ser uma oportunidade para criar valor transforma-se em uma competição desgastante, onde a abundância de mensagens prejudica a efetividade das campanhas e compromete a percepção de qualidade da publicidade.
Cabe ressaltar que, embora essa situação pareça recente, o conceito de “paradoxo da abundância” na publicidade remonta à década de 50. Em 1957, esse fenômeno foi descrito como “paradoxo da fartura” (paradox of plenty), onde a saturação de informações e opções resultava em uma eficácia publicitária reduzida, mesmo com o aumento dos investimentos. A grande diferença no contexto atual é a significativa diminuição dos custos de veiculação, especialmente após a popularização da Inteligência Artificial no setor.
O Papel da Inteligência Artificial nas Campanhas Publicitárias
Nos últimos anos, a Inteligência Artificial tem desempenhado um papel estratégico no planejamento, personalização e entrega de campanhas publicitárias. Pesquisas revelam que mais de 97% dos líderes de marketing no Brasil utilizam a IA em suas estratégias, o que se traduz em um aumento no retorno sobre investimento e na qualidade do conteúdo gerado. No entanto, a quantidade de campanhas criadas neste ano é impressionante e, paradoxalmente, em meio a essa enxurrada de mensagens emocionais, ficou claro que a quantidade não se equipara à qualidade.
Um exemplo recente que ilustra essa situação é o do McDonald’s na Europa. O anúncio natalino, idealizado por inteligência artificial, foi retirado de circulação após críticas relacionadas à falta de conexão emocional. Este episódio ressalta a importância de equilibrar a tecnologia com a sensibilidade humana e uma narrativa afetiva que ressoe com o público.
Marcas que Escolhem a Qualidade em vez da Quantidade
No Brasil, algumas marcas aprenderam a lição. Varejistas digitais como Americanas e Casas Bahia enfrentaram reações negativas nos anos anteriores, devido ao excesso de comunicações promocionais durante o fim do ano, notadamente por meio de e-mails, notificações push e postagens em redes sociais. O bombardeio de ofertas, muitas vezes repetitivas, trouxe críticas e um aumento no descadastramento, um claro indicativo do cansaço do público.
Por outro lado, marcas tradicionais como Magazine Luiza, Natura e O Boticário adotaram uma abordagem mais cautelosa em suas campanhas de Natal. Em vez de se concentrarem na quantidade, elas optaram por narrativas bem definidas que priorizavam propósito, experiência e relacionamento. O resultado foi um maior engajamento orgânico e melhor lembrança de marca, mesmo com uma frequência de exposição inferior.
O Equilíbrio entre Tecnologia e Emoção
Além disso, as campanhas promovidas pelo Governo de Estado e pela CDL/BH em 2025 também se destacaram por encontrarem um equilíbrio apropriado entre tecnologia e emoção. Ambas as iniciativas conseguiram engajar o público sem o uso excessivo de estímulos, focando em narrativas que valorizam a memória afetiva, laços familiares e símbolos culturais locais. A abordagem do governo enfatizou pertencimento e solidariedade, enquanto a CDL/BH apresentou histórias do cotidiano com forte apelo comunitário, gerando identificação e uma comunicação impactante que não apenas estimulou o consumo, mas também estabeleceu laços com o público.
Essas diferenças ilustram um contraste entre dois modelos emergentes no mercado: a marca barulhenta, que tenta ocupar todos os espaços e comunica incessantemente, e a marca silenciosa, que escolhe quando se manifestar, priorizando a precisão sobre a quantidade. Em um cenário saturado de estímulos, a atenção do consumidor se torna um recurso escasso.
Reflexões para o Futuro da Publicidade
O Natal de 2025 reforça uma lição importante que os profissionais de marketing começam a entender: o impacto não está em falar mais alto, mas sim em falar melhor, e muitas vezes menos. Em 2026, as marcas que prosperarão serão aquelas que souberem transformar dados em histórias relevantes, evitando se perder em meio ao ruído.

